sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Eterna questão que eu sempre tive:

Se uma pessoa tem vocação matrimonial, esta vocação concretiza-se com uma determinada pessoa específica? Ou se for viver para a Argentina é com uma pessoa, mas se fosse para a Irlanda seria com outra pessoa? (a pergunta é clara?) E em qualquer dos casos, estaria bem casado?

Caso específico: Hugo e Inês têm vocação para casar UM COM O OUTRO, ou tinham apenas vocação para casar e o facto de estarem casados um com o outro foi fruto das circunstâncias da vida? (trip senza!)

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17 comentários:

mvs disse...

Acho que não há diferença entre estares na Irlanda ou na Argentina. Se estiveres a seguir o plano que Deus tem para ti, em qualquer um desses lados vais encontrar a pessoa que Ele escolheu para ti. Pode ser que Ele te encaminhe numa viagem à Argentina e lá encontres a "tal" pessoa. Ou numa viagem a Roma, por exemplo. Como dizia Sta. Teresinha, tudo é graça.
Por mim, acho que cada um tem uma vocação individual. No caso do matrimónio, ela realiza-se com uma pessoa concreta, pessoa essa escolhida a dedo por Deus para nós. Ele não planeia isto ao calhas. É a pessoa indicada para nos ajudar a crescer e a aproximarmo-nos cada vez mais dEle. Se Ele nos pede para sermos um só corpo com essa pessoa, não iria certamente escolher uma ao calhas. Faz tudo parte de um plano muito bem elaborado, desde a Criação.
Claro que há pessoas que fogem do esquema, porque não querem aceitar a sua vocação ou porque se perderam pelo caminho. Mas mesmo para essas Deus tem um plano B, que as vai fazer felizes, mesmo que já não seja com essa pessoa que Ele tinha escolhido inicialmente. É um caminho mais difícil, mas possível.

Filipe d'Avillez disse...

Não concordo Mariana. O teu texto cheira-me muito a determinismo. Deus esolhe as pessoas para nós, escolhe os nossos caminhos, escolhe os nossos amigos, as nossas profissões, as nossas doenças, as nossas desgraças... e nós escolhemos o quê?

Eu tenho vocação para o matrimónio. Essa vocação realizou-se com a Ana, e sou imensamente feliz assim, e com a Ana tenciono ser Santo.

A Ana é a única pessoa no mundo que pode ajdar-me a ser santo? Era a única com quem eu poderia casar? Não acredito nisso. Não somos meramente duas peças de puzzle que se encaixam.

Aliás, eu e a Ana temos aspectos que não conjugam. Não são inultrapassáveis, mas precisam de trabalho e de atenção para serem resolvidos.

No nosso caso específico, temos formas de espiritualidade muito diferentes. Nalgumas coisas isso é bom, noutras dificulta a nossa caminhada, mas ultrapassa-se.

É possível que exista alguem no mundo que tem um perfil perfeito para mim, para desenvolver ao máximo o meu potencial de santidade, e eu o dela. Azar, conheci a Ana, apaixonei-me por ela, é com ela que quero percorrer este caminho.

E se tivesse conhecido a outra? Talvez tivesse casado com ela, e seria também feliz. Não mais feliz, porque é impossível, mas seria talvez tão feliz. Mas o que é que isso me interessa? Não foi esse o caminho que tomei.

Isto não implica que eu não tenha vocação para ser casado "com a Ana". Na medida em que, uma vez que eu discerni essa vocação ao lado dela, e concretizei-a com ela, a Ana tornou-se inseparável da minha vocação matrimonial. Não consigo imaginar a minha vocação sem a Ana, sinto, de facto, que a minha vocação é ser casado com ela.

Enfim, é a minha maneira de ver este assunto.

mvs disse...

De qualquer maneira, acredito que foi a Providência Divina que colocou o meu marido no meu caminho, fez com que nos encontrássemos e quisessemos casar.
A nossa liberdade está em querermos ou não escolher esse caminho proposto por Deus. Por isso disse que existem pessoas que não seguem a sua vocação, que fazem escolhas diferentes daquelas que Deus teria inicialmente pensado para elas, mas mesmo assim isso não faz com que Ele não tenha uma segunda oportunidade para elas serem felizes, noutra circunstância qualquer. Maria também teve opção quando o Anjo lhe disse que Deus a tinha escolhido para ser Mãe de Jesus. No caso dela, optou por seguir a vontade de Deus.
Não acho que seja determinismo, simplesmente acredito na Vontade de Deus e que quando me aproximo mais dela, as coisas correm melhor.
Claro que eu podia não ter casado com o meu marido e esperar por outra oportunidade. Será que seria feliz nessa altura? Talvez, não sei. O que sei é que Deus encaminhou-me nesta direcção e sinceramente estou muito bem assim.

Zé Maria Duque disse...

Segundo ouvi um padre dizer uma vez (e foi uma padre que percebe mto do assunto) uma pessoa não pode dizer que a sua vocação é o casamento sem estar apaixonada.

Por isso parece-me que uma pessoa só pode ter vocação para o casamento com uma pessoa em específico.

Senzhugo disse...

o caminho faz-se andando.
A pergunta podia-se colocar em relação ao outro sacramento: porque o Duarte quer ser diocesano? Porque é que o Pedro Luz quer ser Jesuíta? Porque é que o Frei Bernas é franciscano? A revelação sim, foi para todos, todos ficámos a saber qual o objectivo universal. Deus manifesta-se de várias maneiras mas no que toca à vida de cada um será sempre uma manifestação particular.
Confesso que tenho alguma dificuldade em aceitar em abstracto que, se tenho vocação para ser padre, poderá ser em qualquer congregação, tal como se tiver vocação para o matrimónio, poderá ser com qualquer mulher. Acredito que fruto da nossa relação e intimidade com Deus e das escolhas que vamos fazendo ao longo da vida, vamos compreendendo melhor com quem devemos casar ou onde devemos ser ordenados padres. Assim, tendo em conta o caminho que vamos percorrendo (por acção ou inacção), chegará uma altura em que a vocação será certa e inevitável.
Uma boa imagem que me ocorre é a de um gps. Quando estamos em casa e marcamos um destino, ele dá-nos um itinerário. Sempre que nos desviamos desse caminho por erro ou deliberadamente, ele pára e recalcula o nosso percurso de modo a que cheguemos sempre ao destino final.
Não creio nem em determinismo nem em livre-arbítrio. Não estava pré-estabelecido que A ia para a ordem B ou que C iria casar com D, mas também não se trata de obra do acaso.
O caminho por onde andas dir-te-á como irás ser Santo.

Pipos disse...

Eu concordo mais com o Filipe.

Eu neste momento tenho a certeza que a minha vocação é o matrimónio e sei que tenho a namorada ideal, para me ajudar a cumprir essa vocação e a levar-me a ser Santo. Não tenho nenhuma dúvida.

Deus pôs-me a Maria no meu caminho, e assim fez-me perceber a minha vocação e ter a certeza que é com ela que quero ficar para o resto da vida e assim vou ser feliz e Santo. (bolas, quem avisa a Maria que eu comentei aqui?)

Mas se não fosse a maria posta no meu caminho, outra pessoa seria de certeza, e como diz o Filipe outras pessoas no mundo poderiam encaixar igualmente na minha felicidade e santidade.

Imaginem o casal Jorge e Camila. Decidiram casar porque a vocação deles era essa e eram extremamente felizes, santos, completos, apaixonados, tudo o que há de bom... voces dizem que a vocação deles era um com o outro e que tinham de se encontrar ... e se um deles morrer? será que não se podem casar outra vez e ser igualmente felizes com outros? a própria Igreja aceita isso.

Espero que tenham percebido o exemplo de na minha opiniao que a vocação matrimónio ganha à pessoa X...

João Silveira disse...

Bem, tivemos esta mesma discussão na mesa Senza, no casamento Senza. Este assunto é complicado, porque nós estamos no tempo, e Deus não está, o que não facilita nada. Mas o que me parece é que Deus faz cada um de nós, com um determinado propósito, nos chama a ser um determinado membro deste Corpo. E que se eu decidir bem, fazendo minha, a Sua vontade, vou cumprir a minha missão aqui na Terra, e ser mais feliz do que se não o fizesse.

Parece-me que existem erros mais graves do que outros, coisas que me afastam mais do caminho que Deus preparou para mim. Por ex, se eu disser mal de uma pessoa, não o deveria fazer, mas não é tão determinante do que se decidir matar alguém, e por causa disso ficar preso o resto da vida. Se Deus me chama ao sacramento do matrimónio, supostamente com e a Marisa (personagem fictícia), e eu decido ir para padre, estarei a desviar-me mais da minha vocação, do que se casar com a Marília (outra personagem fictícia). Isto porque a minha vocação é em primeiro lugar para constituir família, e só depois poderá ser constituir família com uma determinada pessoa. Parece-me o mais lógico.

O Papa João Paulo II e a Madre Teresa teriam sido tão felizes se tivessem casado (não um com o outro)? Seria indiferente para eles e para os outros? Não me parece. Acho que fizeram a escolha certa, e os resultados estão à vista.

Pipos, já disse à Maria para vir ver o teu comentário amoroso, depois disto espero ser convidado para o casório.

Filipe d'Avillez disse...

Mas de um ponto de vista determinista, João, se eu matar alguém e for para a prisão e me converter na prisão e por isso for salvo, então posso argumentar que cumpri o plano de Deus, porque se não não me teria convertido.

É o perigo das teorias em que Deus já decidiu tudo por nós e nós limitamo-nos a não nos desviarmos do percurso.

Gosto de pensar que Deus confia um pouco mais na minha liberdade do que isso.

Duarte 16 disse...

Estou aqui a imaginar o casamento da Madre Teresa e do Papa João Paulo II!!
Mais beato que o do Francisco e da Marta, se isso é possível!!

João Silveira disse...

Filipe, não vamos confundir determinismo com o que eu disse, são coisas bem diferentes. Determinismo é dizer “só podia ser assim”. Por ex, depois de revelado o terceiro segredo de Fátima, o Ali Ağca, que disparou contra o Papa, queria ser libertado, porque dizia que não tinha culpa, que tinha sido um instrumento de um plano divino. Isto está completamente errado, foi ele que decidiu, com toda a sua liberdade, disparar sobre o Papa, podia não o ter feito. O que Deus faz é pegar numa coisa má, e daí conseguir tirar o be, como faz sempre. O maior exemplo disso é a forma como fomos redimidos, mas essa é outra conversa.

Se Deus tem um caminho para mim, em que é que isso me retira liberdade? A verdadeira liberdade é adesão ao Bem, logo esse caminho só me poderá tornar mais livre. Mas a omnipotência de Deus detém-se perante essa minha decisão, tenho que ser eu, com o meu livre-arbítrio, a escolher, aliás como em qualquer relação de verdadeiro amor. Deus não decidiu nada por nós, mas sabe que seremos mais felizes se escolhermos X em vez de escolhermos Y. Não faz sentido? Nossa Senhora não foi mais feliz por ter dito sim, ou faça-se? Parece-me que foi mais feliz, que foi mais livre, em ter feito a vontade de Deus, que nunca choca com a liberdade humana.

Filipe d'Avillez disse...

João, quando eu digo "mas de um ponto de vista", estou no fundo a dizer que o teu ponto de vista é outro.
Dito isto, estou de acordo com o que dizes. Estava a alertar para um perigo comum, e não a acusar-te desse erro.
A minha insistência com esta questão pode parecer picuínhas, especialmente quando falamos de coisas boas como o amor ou o casamento, mas torna-se mais importante quando se fala do sofrimento.
É fácil e bonito eu dizer que a Ana está na minha vida porque Deus a "colocou" no meu caminho.
Mas é mais problemático eu dizer que Deus retirou alguem da minha vida.
As crianças não morrem porque "chegou a sua hora" nem porque "Deus leva primeiro aqueles de quem mais gosta", ou outras coisas que tais que dizemos em tempos de tragédia.
Mas é intelectualmente e teologicamente mais simples para nós simplificarmos as coisas desta maneira, e é isso que me preocupa mais.

João Silveira disse...

Não concordo com essa frase "Deus leva primeiro os que ama". Acho que faz parte de alguma tradição mais supersticiosa, para procurar consolo.

Dizes que é facil e bonito dizer que Deus pos a Ana no teu caminho. Mas é fácil, bonito e verdadeiro ou não? A alternativa é o acaso, foi o acaso que vos juntou. Claro que quando se pensa em coisas "más", é mais difícil de perceber o bem. Mas pela minha experiência, o bem das coisas "más" demora tempo, mas vem, muito especialmente se foram bem vividas.

O que entendes por vontade de Deus?

Filipe d'Avillez disse...

Antes de mais, convém esclarecer que estamos a falar de um dos problemas teológicos mais debatidos (e menos resolvidos) da história. As minhas opiniões não têm outra autoridade que não a minha, logo muito pouca, mas não deixa de ser um assunto sobre o qual tenho pensado muito nos últimos anos.

Dito isto, e para responder às tuas perguntas.

Deus juntou-nos no sentido em que tudo deriva de Deus. Ele criou-nos, é o princípio e o fim de todas as coisas, logo eu não teria conhecido a Ana se ela não tivesse sido criada por Ele, etc. etc.
Mas não acredito que Ele tenha pensado “bom, agora é melhor fazer nascer a Ana, porque assim daqui a 21 anos faço com que ela seja convidada para ser RN das EJNS em Portugal, e assim casa-se com o Filipe, etc. etc.”
Agora, isso não quer dizer que foi obra do acaso. No meio disto tudo ainda existo eu com o livre-arbítrio de que Deus me dotou, e a Ana idem aspas.
Na medida em que eu aderi às EJNS e à Igreja, fui-me mantendo próximo do Senhor (com as falhas e os pecados evidentes). A Ana a mesma coisa.
Nesse sentido não foi por acaso que nos conhecemos, conhecemo-nos porque ambos nos encontramos num caminho que escolhemos livremente percorrer.
Sendo um bom caminho, um caminho que procura aproximar-nos de Cristo, eu nunca duvidei que encontraria coisas boas nesse caminho, e foi o que aconteceu. Não só com a Ana e o nosso casamento, mas com todas as outras graças que recebi, e nas quais se incluem todos vocês.

Perguntas-me o que entendo por “Vontade de Deus”.
A Vontade de Deus, e mais especificamente a Vontade de Deus para mim, não difere muito da vontade de Deus para ti, e para todos. Ser Santo, porquanto a santidade significa seguir de forma perfeita Deus, configurando-me com o Seu Divino Filho Jesus Cristo, que é Deus com Ele.
Transpondo isto para linguagem geográfica, Deus forneceu-me um Mapa. Tem marcado o ponto de partida e o ponto de chegada. Mas não me obriga a seguir qualquer estrada ou trilho.
Ao contrário do que escreveu o Hugo, não concordo com a analogia do GPS, um aviso a dizer “vira à esquerda, agora à direita, agora casa-te com esta, agora muda de emprego, agora muda de país”, mas acredito que quando eu vou por caminhos errados, e acabo no meio de um pântano, posso sempre pegar naquele mapa e orientar a minha vida novamente para Deus.
E posso mais, claro, posso rezar para que Deus me ajude a decidir qual o melhor caminho a seguir. E quanto mais próximo eu estiver dele, quanto mais forte for a nossa relação, mais fácil se torna discernir os conselhos que Ele me dá, e menos me engano.

Para terminar, em relação a isto:

“Claro que quando se pensa em coisas "más", é mais difícil de perceber o bem. Mas pela minha experiência, o bem das coisas "más" demora tempo, mas vem, muito especialmente se foram bem vividas.”

Isto é bonito, e consolador, e quem sabe, talvez até seja verdade em alguns casos. Mas não acredito que seja verdade da forma como muitas vezes se diz, ou seja, as coisas más não são necessariamente fruto da vontade de Deus.

Vou tentar explicar-me melhor. Deus permite que aconteçam coisas más, no sentido em que Deus tudo pode impedir, tudo pode fazer, logo se não as impede está implicitamente a permiti-las, mas isso é diferente de dizer que ele é responsável por elas.

Há coisas que nos parecem más, mas no futuro vamos a ver que afinal foram boas. Por exemplo, o facto da Ana ter sido despedida o ano passado, na altura parecia que iria ser uma coisa terrível, mas acabou por revelar-se das melhores coisas que nos podia ter acontecido.

Mas há outras coisas que são indiscutivelmente más. Não há forma de as ver de outra maneira. O tsunami, um aborto espontâneo, a morte de um bebé já nascido, o holocausto, a violação de uma rapariga… O meu cérebro simplesmente não pode aceitar que alguma destas coisas tenha sido fruto da vontade de Deus. Simplesmente não é possível.

Quer isto dizer que destas terríveis tragédias não podemos, com a ajuda e o discernimento de Deus, retirar coisas boas? Nada disso, claro que podemos, e se não fosse isso não haveria qualquer esperança nas nossas vidas.

Por isso sim, do mal é sempre possível resgatar algum bem (onde abunda o pecado, superabunda a Graça), mas de forma alguma podemos concluir por isso que Deus quis que esse mal acontecesse, que isso faça parte de algum super-plano que Ele tem para nós.

No meio de tudo isto, este Deus que tanto nos Ama, opta por vezes por interferir directamente nas nossas vidas, no nosso tempo e nas nossas histórias. Mas a isso chamamos milagres. Não tem havido falta desses na minha vida, mas isso é outra história.

Desculpa a extensão da resposta, mas é difícil falar destas coisas em “soundbytes”.

Deus nos guarde a todos na sua Misericórdia

Duarte 16 disse...

Filipe, estás a ficar lamechas.

«(...)conhecemo-nos porque ambos nos encontramos num caminho que escolhemos livremente percorrer.
Sendo um bom caminho, (...)nunca duvidei que encontraria coisas boas (...) nas quais se incluem todos vocês.

Agora sim, ganhei o dia!

Filipe d'Avillez disse...

O que é que queres, é da idade!

João Silveira disse...

Realmente este é um problema complexo. E em teoria poderia concordar com tudo o que dizes, mas na prática não posso.

Não queres atribuir ao acaso o facto de tu e a Ana estarem juntos, acho muito bem. Mas por outro lado também não o podes atribuir a Deus, porque existiram muitas condicionantes que fizeram com que acabassem juntos, o que em última análise atribui o facto de estarem juntos às decisões que tomaram. Ou seja, quando agradeceres coisas a Deus, “apenas” poderás agradecer a tua existência, porque tudo o que aconteceu daí para diante deveu-se às tuas decisões. O que teoricamente é inegável, se não tivesses decidido pedir a Ana em casamento, muito provavelmente nunca se casariam, mas na prática põe a vontade de Deus fora de tudo o que nos acontece. É difícil entender que Deus leva em conta todas as variáveis para juntar duas pessoas? É. É difícil entender o que quer dizer: “para Deus não existe tempo”? É. Mas lá por ser difícil de entender não quer dizer que não seja verdade.

Dizes que a vontade de Deus é só um ponto de partida e chegada na minha vida, mas vejo mais a vontade de Deus em todos os metros desse meu caminho, em todas as decisões que tomo, por mais ínfimas que sejam. A vontade de Deus corresponde sempre ao que (provavelmente a longo prazo) me vai preencher, me vai tornar mais feliz, e por definição, mais perto do meu destino, esse ponto de chegada.

A vontade de Deus pode ser causar o mal? Absolutamente, claro que não. Mas aí teremos que definir o que é mal e o que é bem. Um cancro é mal? Sofrer é mal? Ou apenas o pecado é mal? Recordando as palavras de Nossa Senhora aos pastorinhos, em Maio: “Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em acto de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de suplica pela conversão dos Pecadores?”

Nossa Senhora, como “porta-voz” de Deus propõe o sofrimento àquelas crianças. Pode Deus propor o mal? Não me parece. Então aquilo tem que ser bem. Mas porquê bem em forma de sofrimento? É o mistério da redenção, quem ama está disposto a sofrer. E esse sofrimento tem em vista acabar com o verdadeiro mal, as ofensas a Deus, e o pecado. Esse é o mal, é esse que Deus permite, mas que nunca propõe. As outras “desgraças” que acontecem no mundo não são o mal, no sentido em que não têm a última palavra, essa pertence a Deus.

Li um livro interessante que se chama “Milagres Hoje”, da irmã Briege Mckenna, que tem o dom da cura. A uma dada altura da vida dela, sentia-se frustrada, porque Jesus curava umas pessoas e outras não, não estava a perceber a lógica. E aí percebeu que a verdadeira cura é aceitar a vontade de Deus. E testemunha que já viu muitas conversões virem de pessoas que morrem de cancro, por ex. À primeira vista é chocante que Deus queira que uma pessoa tenha cancro, para curar o mal espiritual de outras, ou dela própria. Mas o pecado não é mil vezes pior do que qualquer cancro? Não foi assim que Jesus nos salvou?

Este assunto é mesmo complicado, especialmente por duas razões:

- Por mais que digamos que acreditamos no Céu, continuamos a achar que quem morre é um coitadinho.

- Achamos que o facto de haver uma vontade de Deus em relação a tudo o que temos que decidir, diminui de algum modo a nossa liberdade.

Filipe d'Avillez disse...

A resposta ao Silveira, tarde e a más horas, surgiu publicada no blog dos peregrinos:

http://peregrinosdesantiago.blogspot.com/2009/02/casamento-sofrimento-e-vontade-de-deus.html